Associação Mundial de Rádios Comunitárias divulga comparação entre leis do setor europeu e sul-americano
Um ar mais livre? Uma breve abordagem comparativa da situação legal das rádios comunitárias na Europa e América do Sul
Nils Brock (Doutorando da Universidade Livre de Berlim e cooperante do EED para o Programa de Legislação da Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil. Email: galapagos@gmx.net)
João Paulo Malerba (Doutorando do Programa de Pós-graduação da Escola de Comunicação da UFRJ e coordenador executivo da Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil. Email: joaopaulorj@yahoo.com.br)
Na semana em que se completam 15 anos da Lei 9.612, que regula a radiodifusão comunitária no Brasil, a Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil lança um estudo comparativo da situação legal das comunitárias na Europa. O presente texto é um desdobramento de uma pesquisa anterior com a legislação de todos os países sul-americanos e destaca agora cinco marcos legais de quatro países: França, Irlanda, Espanha e Alemanha (nos estados federativos de Saxônia-Anhalt e Baviera).
O objetivo é oxigenar o caso brasileiro com exemplos – negativos e positivos – internacionais que impulsionem a necessária renovação do marco legal do setor, a fim de efetivamente promover e favorecer a radiodifusão comunitária no Brasil.
1. Considerações iniciais
O que é uma rádio comunitária? Essa pergunta não pode ser respondida de maneira geral e com uma definição única. Pelo contrario, rádios comunitárias são experiências sempre singulares e apresentam diferentes trajetórias de práticas e conceitos. Reconhecer essa diversidade não só ajuda a ampliar o entendimento acerca de uma determinada emissora comunitária, mas também permite colocar em debate as próprias experiências e perspectivas. Essa convicção está na base do presente texto que pretende dar um panorama sobre a atual situação das rádios comunitárias na Europa, a partir de cinco casos específicos. Em seguida iremos tecer algumas comparações com a situação legal de suas congêneres da América do Sul.
A história das rádios participativas na Europa vem de longe. Por isso, inicialmente, é importante chamar a atenção quanto a algumas especificidades do caso europeu. Muitos consideram que a origem do movimento radiofônico livre está nas notórias rádios piratas da Inglaterra (e, mais tarde, na França e Holanda) dos anos 1950. Mas, assim como o próprio rádio tem muitos inventores, suas raízes livres são mais diversificadas. Por isso, vale destacar as primeiras emissoras de clubes de trabalhadores que surgiram na Áustria e Alemanha no final dos anos 1920 ou as transmissões clandestinas da Résistance Française durante a Segunda Guerra Mundial (PERUZZO, 2006). Rapidamente as rádios piratas foram ultrapassadas pelo movimento de rádios livres na Itália e na França, que foi copiado em muitos outros lugares também. (KOLLEKTIV A, 1977). É esse rizoma diverso de experiências e práticas que influenciam nos distintos modelos atuais. Coexistem vários formatos de rádios participativas: rádios livres, comunitárias, associativas, não comerciais, cidadãs, do terceiro setor, para mencionar somente as nomenclaturas mais importantes. Não podemos esquecer essa diversidade quando falamos aqui das mais de 2.200 “rádios comunitárias” europeias, termo que, por fim, usaremos no seguinte texto para comparar as distintas possibilidades legais para exercer o direito à comunicação nas frequências radiofônicas 3.
Outra especificidade da situação europeia reside na pluralidade das leis e recomendações que regem o exercício das mídias em níveis supranacionais, nacionais e, às vezes, também regionais. Nessas leis, rádios comunitárias muitas vezes não recebem a atenção que merecem ou, o que é mais notório, nem chegam a ser legalmente reconhecidas. Segundo um estudo do Fórum de Mídia Comunitária Europeu (CMFE) realizado em 2012, dentre 39 países europeus (inclusive alguns que não fazem parte da União Europeia), em somente 17 as rádios comunitárias são reconhecidas plenamente pela lei e reguladas como um setor independente 4.
O próprio Parlamento Europeu criticou essa situação no ano de 2008, recomendando “a introdução de um código de conduta, para além do reconhecimento jurídico, esclarecendo o estatuto, os procedimentos e o papel do setor, contribuindo para a sua segurança, garantindo a sua independência e prevenindo condutas incorretas.”5 Um ano depois, o Comitê de Ministros do Conselho Europeu precisou essa ideia e declarou desejável a criação de um terceiro setor para a mídia comunitária, separado dos já existentes setores comercial e público. Como demonstram as cifras citadas, até hoje muitos países não seguem essas recomendações.
Há explicações históricas, conjunturas políticas atuais e também estruturas dos próprios países que explicam essa resistência a uma mudança. A França, por exemplo, até hoje segue sendo uma república muito centralista, onde a noção do comunitário e os correspondentes direitos particulares chocam com a visão política da nação e dos cidadãos. Por outro lado, a Alemanha, que historicamente, até o século XX, foi uma colcha de retalhos sem um forte governo central, cada estado federal (existem 16 no total) define a sua própria lei de mídia, algumas delas, como vamos ver, a favor da mídia comunitária e outras não.
Para completar essas considerações iniciais gerais, vale a pena mencionar que as conjunturas políticas atuais mais dinâmicas a respeito do setor da mídia comunitária são encontradas nos países da Europa Oriental. Há exemplos preocupantes, como as tentativas do atual governo da Hungria de censurar as 40 rádios comunitárias regularizadas, algo que só foi interrompido depois de muita pressão da União Europeia 6. Um exemplo mais promissor é o da Tchecoslováquia, onde, segundo o pesquisador e membro do CMFE, Henry G. Loeser, “os cidadãos, os reguladores e as elites políticas poderiam ter a oportunidade de tomar passos em favor de um sistema de três setores [público, comercial e comunitário], usando o modelo efetivo da União Europeia e as suas contrapartes como mapa de rota.” (LOESER, 2010). Essas leis dinâmicas e emergentes podem dizer muito acerca da futura definição e realidade da mídia comunitária europeia. No restante do artigo, iremos vislumbrar a paisagem já estabelecida e arriscar algumas comparações com o cenário latino-americano.
Para ler o artigo completo acessar: http://testelaje.files.wordpress.com/2013/02/umarmaislivrenilsbrockjoaomalerbaversaofinal-1.pdf
Nils Brock (Doutorando da Universidade Livre de Berlim e cooperante do EED para o Programa de Legislação da Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil. Email: galapagos@gmx.net)
João Paulo Malerba (Doutorando do Programa de Pós-graduação da Escola de Comunicação da UFRJ e coordenador executivo da Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil. Email: joaopaulorj@yahoo.com.br)
Na semana em que se completam 15 anos da Lei 9.612, que regula a radiodifusão comunitária no Brasil, a Associação Mundial de Rádios Comunitárias – AMARC Brasil lança um estudo comparativo da situação legal das comunitárias na Europa. O presente texto é um desdobramento de uma pesquisa anterior com a legislação de todos os países sul-americanos e destaca agora cinco marcos legais de quatro países: França, Irlanda, Espanha e Alemanha (nos estados federativos de Saxônia-Anhalt e Baviera).
O objetivo é oxigenar o caso brasileiro com exemplos – negativos e positivos – internacionais que impulsionem a necessária renovação do marco legal do setor, a fim de efetivamente promover e favorecer a radiodifusão comunitária no Brasil.
1. Considerações iniciais
O que é uma rádio comunitária? Essa pergunta não pode ser respondida de maneira geral e com uma definição única. Pelo contrario, rádios comunitárias são experiências sempre singulares e apresentam diferentes trajetórias de práticas e conceitos. Reconhecer essa diversidade não só ajuda a ampliar o entendimento acerca de uma determinada emissora comunitária, mas também permite colocar em debate as próprias experiências e perspectivas. Essa convicção está na base do presente texto que pretende dar um panorama sobre a atual situação das rádios comunitárias na Europa, a partir de cinco casos específicos. Em seguida iremos tecer algumas comparações com a situação legal de suas congêneres da América do Sul.
A história das rádios participativas na Europa vem de longe. Por isso, inicialmente, é importante chamar a atenção quanto a algumas especificidades do caso europeu. Muitos consideram que a origem do movimento radiofônico livre está nas notórias rádios piratas da Inglaterra (e, mais tarde, na França e Holanda) dos anos 1950. Mas, assim como o próprio rádio tem muitos inventores, suas raízes livres são mais diversificadas. Por isso, vale destacar as primeiras emissoras de clubes de trabalhadores que surgiram na Áustria e Alemanha no final dos anos 1920 ou as transmissões clandestinas da Résistance Française durante a Segunda Guerra Mundial (PERUZZO, 2006). Rapidamente as rádios piratas foram ultrapassadas pelo movimento de rádios livres na Itália e na França, que foi copiado em muitos outros lugares também. (KOLLEKTIV A, 1977). É esse rizoma diverso de experiências e práticas que influenciam nos distintos modelos atuais. Coexistem vários formatos de rádios participativas: rádios livres, comunitárias, associativas, não comerciais, cidadãs, do terceiro setor, para mencionar somente as nomenclaturas mais importantes. Não podemos esquecer essa diversidade quando falamos aqui das mais de 2.200 “rádios comunitárias” europeias, termo que, por fim, usaremos no seguinte texto para comparar as distintas possibilidades legais para exercer o direito à comunicação nas frequências radiofônicas 3.
Outra especificidade da situação europeia reside na pluralidade das leis e recomendações que regem o exercício das mídias em níveis supranacionais, nacionais e, às vezes, também regionais. Nessas leis, rádios comunitárias muitas vezes não recebem a atenção que merecem ou, o que é mais notório, nem chegam a ser legalmente reconhecidas. Segundo um estudo do Fórum de Mídia Comunitária Europeu (CMFE) realizado em 2012, dentre 39 países europeus (inclusive alguns que não fazem parte da União Europeia), em somente 17 as rádios comunitárias são reconhecidas plenamente pela lei e reguladas como um setor independente 4.
O próprio Parlamento Europeu criticou essa situação no ano de 2008, recomendando “a introdução de um código de conduta, para além do reconhecimento jurídico, esclarecendo o estatuto, os procedimentos e o papel do setor, contribuindo para a sua segurança, garantindo a sua independência e prevenindo condutas incorretas.”5 Um ano depois, o Comitê de Ministros do Conselho Europeu precisou essa ideia e declarou desejável a criação de um terceiro setor para a mídia comunitária, separado dos já existentes setores comercial e público. Como demonstram as cifras citadas, até hoje muitos países não seguem essas recomendações.
Há explicações históricas, conjunturas políticas atuais e também estruturas dos próprios países que explicam essa resistência a uma mudança. A França, por exemplo, até hoje segue sendo uma república muito centralista, onde a noção do comunitário e os correspondentes direitos particulares chocam com a visão política da nação e dos cidadãos. Por outro lado, a Alemanha, que historicamente, até o século XX, foi uma colcha de retalhos sem um forte governo central, cada estado federal (existem 16 no total) define a sua própria lei de mídia, algumas delas, como vamos ver, a favor da mídia comunitária e outras não.
Para completar essas considerações iniciais gerais, vale a pena mencionar que as conjunturas políticas atuais mais dinâmicas a respeito do setor da mídia comunitária são encontradas nos países da Europa Oriental. Há exemplos preocupantes, como as tentativas do atual governo da Hungria de censurar as 40 rádios comunitárias regularizadas, algo que só foi interrompido depois de muita pressão da União Europeia 6. Um exemplo mais promissor é o da Tchecoslováquia, onde, segundo o pesquisador e membro do CMFE, Henry G. Loeser, “os cidadãos, os reguladores e as elites políticas poderiam ter a oportunidade de tomar passos em favor de um sistema de três setores [público, comercial e comunitário], usando o modelo efetivo da União Europeia e as suas contrapartes como mapa de rota.” (LOESER, 2010). Essas leis dinâmicas e emergentes podem dizer muito acerca da futura definição e realidade da mídia comunitária europeia. No restante do artigo, iremos vislumbrar a paisagem já estabelecida e arriscar algumas comparações com o cenário latino-americano.
Para ler o artigo completo acessar: http://testelaje.files.wordpress.com/2013/02/umarmaislivrenilsbrockjoaomalerbaversaofinal-1.pdf
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