A educação contra as armas


Por Cristiane Parente
“No dia 31 de março de 2005, de forma brutal, 29 jovens foram assassinados nas cidades de Nova Iguaçu e Queimados. Todos eles eram pobres, todos inocentes, todos eles sonhavam com um futuro de oportunidades, de dignidade, de direitos. Seus sonhos, suas vidas foram destruídas em uma das maiores chacinas da Baixada Fluminense. Nada explica a morte e o assassinato. Nada pode explicar a barbárie de grupos de extermínio que atuam de forma impune em nossas cidades marcadas pela violência, a exclusão, a segregação e a indiferença assassina dos grupos de poder.
Quase um ano depois, 30 mil educadoras e educadores, militantes sociais, meninos e meninas, delegados e delegadas de mais de 25 países nos reunimos aqui, em Nova Iguaçu, para dizer não à violência, sim à vida, sim à verdade, sim à dignidade, sim à justiça, sim à educação. Realizamos um novo Fórum Mundial onde o tema foi Educação Cidadã para uma Cidade Educadora, um evento histórico, com diversas conferências e debates, com mais de 300 atividades autogestionadas e com um Fórum Infanto-juvenil que reuniu mais de 5 mil meninos e meninas, discutindo a construção de uma nova educação para uma nova sociedade” (...)

O que você leu acima é apenas um pequeno trecho da Carta de Nova Iguaçu, resultado do Fórum Mundial de Educação da Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, em 2006. Apesar de ter sido escrita há seis anos, seus objetivos de construir um processo de mobilização em defesa da garantia de uma educação de qualidade para todos; uma educação como direito humano e forma de inclusão social e prática de liberdade, uma cidade educadora, continuam extremamente atuais.
Essa atualidade se faz notar especialmente quando ainda nos deparamos com fatos como o da menina paquistanesa Malala Yousafzai, de 14 anos, que foi baleada no dia 9 de outubro por talibãs, por ousar ir à escola e contrariar uma lei implementada pelo grupo anos antes, proibindo o acesso aos estudos às meninas/mulheres no Vale de Swat, onde mora Malala.
Nessa época, Malala começou a ser reconhecida no país como uma defensora dos direitos das meninas à educação. Desde 2009, aos 11 anos, ela passou a escrever um blog para o site da BBC Urdu, sob o pseudônimo de Gul Makai, descrevendo sua vida na cidade de Mingora e os atos de violência dos talibãs, que passaram a incendiar, fechar e destruir escolas para meninas. Foram cerca de 200, e milhares de garotas sem estudos formais.
Em 2011 ela ganhou o National Peace Award for Youth no Paquistão e virou personagem de um documentário do New York Times.
Sua luta e obstinação pela educação renderam campanhas como a promovida pela Global Giving (http://goo.gl/glHoL) “Encaminhe 30 garotas paquistanesas para a escola”, que financiará transporte, uniforme e material escolar para as meninas.
Hoje Malala encontra-se num hospital em Birmingham, na Inglaterra, cercada de seguranças, porque os talibãs já disseram que se ela sobreviver voltará a ser atacada. O que eles não esperavam era que esse atentado fosse provocar uma mobilização mundial, um sentimento anti-talibã mesmo no Paquistão, onde ainda possuem simpatizantes.
Não é Malala que está no hospital, enferma, mas toda uma sociedade que, neste momento, reflete sobre seus atos e omissões; políticos e religiosos que precisam assumir sua culpa pelo silêncio e condescendência com a barbárie e os extremismos; líderes que precisam sair de cima do muro e tomar uma posição a favor dos direitos humanos. É a desigualdade, a falta de educação e de equidade, a violência banal que está sob aquela cama clamando que a humanidade tome uma posição; é uma ferida aberta que expõe ao mundo o que a intolerância pode fazer.
Se o exemplo de Malala se multiplicar, se adolescentes, jovens, adultos, homens e mulheres, cidadãos por fim de várias regiões do mundo levantarem sua voz contra esse tipo de intolerância, grupos extremistas como os talibãs não terão mais futuro e se enfraquecerão cada vez mais. E é esse o medo que Malala causa. É esse seu maior trunfo: a pureza de uma menina indignada contra um atentado aos direitos humanos; a luta sincera de uma garota que tornou-se ícone de um país e de várias nações usando apenas palavras, não armas. Essa é a verdadeira lição que os intolerantes precisam aprender!

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