EU Kids Online: Perspetivas Nacionais (Portugal)

Por Cristina Ponte e Ana Jorge

Este artigo consiste na tradução para língua portuguesa da secção relativa a Portugal do relatório "EU Kids Online: National perspectives":, da autoria de Leslie Haddon, Sonia Livingstone e da rede de investigadores do projeto EU Kids Online, no qual se incluem as autoras deste artigo que gentilmente autorizaram a respetiva tradução e publicação no site do Projeto MiudosSegurosNa.Net.

Acesso e Uso
  • As crianças portuguesas são as líderes Europeias ao nível do acesso à Internet através de computadores portáteis, o que é consequência direta de políticas nacionais, particularmente as desenvolvidas após 2008: 65% dos inquiridos têm os seus próprios computadores portáteis, sem diferenças significativas entre famílias. O crescimento rápido e recente da democratização do acesso à Internet também é demonstrado pelo fato do país ainda apresentar uma das médias mais altas na Europa em termos etários para o primeiro uso da Internet: 10 anos de idade.

  • As crianças usam os computadores portáteis sobretudo em casa e particularmente no quarto. 93% das crianças Portuguesas acedem à Internet a partir de casa e 67% fazem-nos nos seus quartos de dormir. Apenas na Suécia e na Dinamarca há mais crianças a aceder à Internet a partir dos seus quartos.

  • Para além da escola, onde 72% das crianças referem ter acesso à Internet, as bibliotecas públicas são usadas como ponto de acesso por 25% das crianças e jovens, o dobro da média Europeia. Considerando que 53% das famílias são de baixo ESE, esta prática pode ser uma forma de compensar o custo de aceder à Internet a partir de casa.

  • Apesar de terem os seus próprios computadores portáteis, as crianças Portuguesas encontram-se entre as que usam a Internet com menor frequência, o que pode explicar o nível de risco relativamente baixo relatado (7% das crianças experimentaram um ou mais riscos sobre os quais foram questionados). 53% das crianças dizem que usam a Internet diária ou quase diariamente.

  • Contudo, em Portugal as crianças mais velhas relatam um dos níveis mais elevados de utilização excessiva (49% em jovens com mais de 11 anos), o que pode estar mais relacionado com a ansiedade causada pelo facto dos pais limitarem o seu acesso à Internet do que com a quantidade de tempo que eles próprios efetivamente gastamonline.

  • O acesso através de telemóveis é ainda marginal, dado que apenas 7% dos rapazes e 2% das raparigas, especialmente os de famílias da classe média, dizem usá-los para aceder à Internet.
Atividades e Competências
  • As crianças portuguesas usam a Internet principalmente para trabalho escolar (89%) e jogos (83%). Ver vídeos, trocar mensagens instantâneas e mensagens de correio eletrónico também são populares (respetivamente 70%, 69% e 66%). Apenas um em cada três lê/vê as notícias na Internet (32%).

  • Os usos produtivos, participativos e criativos são os menos prevalecentes: apenas 11% publicaram uma mensagem num website, 10% passaram tempo num mundo virtual e 7% escreveram um blog ou usaram sites de partilha de ficheiros.

  • Existem diferenças em termos de género entre as crianças/jovens dos 9-12 anos de idade: os rapazes têm mais acesso nos seus quartos e mostram um uso mais diversificado da Internet, enquanto as raparigas usam a Internet sobretudo para trabalhos escolares. Para os 13-16 anos de idade, contatar com outros tornou-se mais prevalecente, quer entre rapazes, quer entre raparigas.

  • As crianças portuguesas relatam uma média de 4.9 competências, colocando o país em oitavo lugar entre os 25 países analisados. A competência digital mais mencionada é adicionar um website aos favoritos (76%), seguida de mudar as definições de privacidade (62%), números acima da média Europeia (64% e 56%, respetivamente). Estes dados escondem diferenças consideráveis em termos etários, com os 14-16 anos a mostrarem mais experiência acumulada.

  • Em termos gerais, comparar websites é uma das competências menos relatadas, e mais de metade das crianças e jovens dos 9-11 anos afirma não saber como pesquisar informação sobre segurança online.

  • Enquanto as crianças e os jovens de classes sociais mais elevadas relatam mais competências em termos da criação de oportunidades e minimização de conteúdos indesejados (favoritos, bloquear mensagens indesejadas e spam, encontrar informação sobre segurança), aquelas de famílias mais desfavorecidas reivindicam maiores competências relativamente à salvaguarda da sua informação online (isto é, mudar definições de privacidade e preferências).

  • Duas em cada três crianças de ESE baixo consideram ser muito verdade quando se diz que sabem mais sobre Internet do que os seus pais.
Riscos e danos
  • Há um baixo nível geral de incidência de risco online entre as crianças e jovens Portugueses utilizadores da Internet: apenas 7% afirmam ter sido incomodados por um ou mais riscos referidos no questionário. As crianças mais jovens, as raparigas e aqueles de famílias mais desfavorecidas parecem ser mais incomodadas pelos riscos que encontram, enquanto também tendem a usar menos a Internet.

  • 13% das crianças portuguesas viram imagens de cariz sexual online e 3% de todas as inquiridas sentem-se incomodadas pela experiência. Embora mais adolescentes e rapazes relatem terem visto estas imagens, as raparigas, as crianças entre os 11-12 anos de idade e as crianças de famílias das classes baixas parecem ser as que mais se sentem incomodadas por elas. Relativamente a mensagens de cariz sexual, 15% dos 11-16 anos de idade dizem terem-nas recebido, mas só 3% admite tê-las enviado.

  • Apenas 2% das crianças diz ter sofrido bullying online, enquanto 9% relata ter sido vítima de bullying presencial, o que segue o padrão Europeu, mas em percentagens significativamente mais baixas. Relativamente a encontros presenciais com pessoas contactadas primeiro online, 16% das crianças relata ter tido esta experiência; a maioria teve apenas uma vez; 2% do total dos inquiridos diz ter-se sentido incomodado pela experiência.

  • A tendência para os rapazes se exporem mais ao risco é inversa no caso do visionamento de conteúdos potencialmente danosos gerados pelos utilizadores e da experiência do mau uso de informação pessoal. Entre os 11-16 anos de idade, as raparigas representam uma percentagem maior: 15% das raparigas e 6% dos rapazes disseram que foram expostos a ambos os riscos referidos.
Mediação parental e segurança
  • Entre os pais europeus, os pais Portugueses são dos que menos usam a Internet: 78% das crianças e jovens em Portugal usaram a Internet em 2010, enquanto 66% dos pais o fizeram. Além disso, apenas cerca de um terço destes pais usam a Internet frequentemente, o que, ligando ao uso prevalecente das crianças no quarto, explica a baixa proporção relativamente à média Europeia de pais que usam a Internet juntamente com os filhos (apenas 43% dos pais o fazem).

  • Em Portugal há ainda um tabu cultural à volta dos riscos sexuais, na medida em que os pais, especialmente de raparigas, resistem a admitir que os filhos têm contacto com imagens ou mensagens de cariz sexual.

  • Crianças e pais Portugueses declaram que gostariam de receber mais informação de professores do que a que recebem (hoje em dia, 28% dos pais dizem obter informação sobre segurança online através das escolas, enquanto que 65% gostariam de receber essa informação).
Implicações para as políticas nacionais
  • A baixa incidência de risco entre crianças e jovens que usam a Internet em Portugal pode ser um sinal de baixo nível de uso frequente e da fraca captação das oportunidades disponíveis online.

  • Apesar da baixa incidência de risco, as crianças de lares mais desfavorecidos aparentam ser mais incomodadas pelos riscos que possam encontrar.

  • A inclusão da educação sobre segurança na Internet nos curricula escolares, desde tenra idade, beneficiaria as crianças e os jovens.

  • Embora a idade média de iniciação seja tardia quando comparada com o resto da Europa, as crianças Portuguesas estão, não obstante, a começar a usar a Internet cada vez mais cedo.

  • Os pais também precisam de desenvolver mais capacidades para ajudar os filhos, dado que são percebidos pelas crianças como sendo incapazes de dar apoio social quando os filhos experimentam riscos. Isto acontece, em grande parte, porque o uso da Internet pelos pais é menor do que o dos seus filhos, especialmente entre as famílias de classes mais baixas.

  • Esta conclusão também sugere a necessidade de uma maior atenção da parte de adultos fora do ambiente familiar para apoiarem e enriquecerem a utilização da Internet por crianças e jovens. Uma vez que as crianças e jovens Portugueses se encontram entre as que mais acedem à Internet a partir de espaços públicos como bibliotecas e centros juvenis, funcionários das bibliotecas, outro pessoal técnico e trabalhadores "sociais" e de juventude deveriam estar preparados para apoiar as crianças e os jovens no seu uso da Internet e também para os ajudar quando experimentam riscos ou estão perturbados por estes.

  • A prontidão dos professores para lidar com as questões de segurança na Internet e para apoiar as crianças e os jovens e suas famílias é uma questão urgente. Assim também é o investimento nas competências digitais de crianças e jovens: apesar das crianças e jovens Portugueses reivindicarem um nível mediano de competências, parecem menos capazes de usar essas competências quando lidam com os riscos.
Foto de Cristina PonteCristina Ponte
Doutorada em 2002, leciona Estudos dos Media na FCSH, UNL. Entre os seus livros contam-se Crianças e Internet em Portugal (MinervaCoimbra), que co-editou, e Crianças e Media (Imprensa de Ciências Sociais), ambos de 2012. Vice-presidente do Grupo Children, Youth and Media, da Associação Europeia de Pesquisa em Comunicação e Educação (ECREA) coordena o Grupo de Trabalho Audience Transformation and Social Integration na COST Action IS0906. Coordenou também o projeto internacional Digital Inclusion and Participation e o projeto nacional Crianças e Jovens nas Notícias (2005-2007). Áreas de especialização: crianças e media; media e gerações; inclusão digital; discurso dos media.
Foto de Ana Jorge
Ana Jorge
Doutorada em Ciências da Comunicação, com tese sobre a relação dos jovens com a cultura da celebridade. Os seus principais interesses de pesquisa são a cultura popular e o consumo, género e receção. Integrou projetos de investigação sobre a representação das mulheres em jornais e revistas, e na inclusão digital e participação.

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